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O compositor de sucessos como “Milla” e “Praieiro” apresenta seu primeiro thriller de ficção, que mistura ação, crítica social e drama psicológico

de_São Paulo

O compositor de sucessos como “Milla” e “Praieiro” apresenta seu primeiro thriller de ficção, que mistura ação, crítica social e drama psicológico

de_São Paulo

Reconhecido em todo o Brasil por composições que marcaram gerações — como “Mila”, “Praieiro”, “De Bandeja” e muitas outras —, o compositor, músico e cantor baiano Manno Góes agora se lança a uma nova aventura: a literatura de ficção. Ele apresentou no último dia 2 de setembro, em Salvador, seu primeiro romance, “A Fraternidade”, publicado pela P55 Edição.

fotos_Caio Lírio

Embora já tenha estreado no universo literário em 2014, com o livro de contos “Acarajé Bour Mercier”, esta é a primeira vez que Manno, fundador da banda Jammil e Uma Noites e atual membro da diretoria da UBC, mergulha no gênero romanesco. Em sua nova obra, ele combina acontecimentos reais, fatos históricos e elementos de cultura pop em uma trama cinematográfica.

“A ideia desse livro foi nascendo devagar. Sempre gostei de contar histórias. A literatura me deu esse espaço maior, com mais fôlego para desenvolver personagens, emoções e cenários. Então, foi uma vontade que foi amadurecendo até virar realidade”, diz Manno em entrevista à Revista.

No centro da narrativa está Jango Echeverria, também chamado de Jack Kevorkian, o Doutor — um assassino profissional perseguido pela mesma organização letal da qual fez parte: a Fraternidade. Estruturado em quatro partes (“Pai”, “Filho”, “Espírito Santo” e “Amém”), o livro percorre diferentes continentes e aborda dilemas éticos, conflitos familiares e episódios de violência, temperados com humor ácido e crítica social.

“É uma história repleta de reviravoltas, com personagens humanos e ambíguos. A cada capítulo trago um pouco do meu universo: referências ao cinema, à composição musical, homenagens à cultura pop e experiências de lugares que conheci e que fazem parte da minha vida”, explica.

Quando e como surgiu essa ideia?

MANNO GÓES: Escrever faz parte do meu dia a dia. Esse livro, especificamente, nasceu há quase quinze anos. Sempre gostei de ler muito em viagens, numa época em que viajava muito fazendo shows com o Jammil e Uma Noites. Os livros e filmes eram meus companheiros de estrada. Apesar do glamour do palco, um cenário invisível na vida de um artista é a solidão dos quartos de hotéis. Eu chamava de “solidão cheia de gente” essa ambiência em que uma multidão te ama não pelo que você é, mas pelo que ela projeta em você por meio de uma apresentação em um palco. Então, como forma de ocupar meu tempo, lia, assistia filmes (eu levava o aparelho de dvd e os filmes, em uma época pré-streaming) e escrevia. A ideia desse livro foi nascendo devagar. Sempre gostei de contar histórias. A literatura me deu esse espaço maior, com mais fôlego para desenvolver personagens, emoções e cenários. Então, foi uma vontade que foi amadurecendo até virar realidade.

Você é um fã de thrillers de mistério? Quais as suas referências desse universo?

Sim, gosto muito. Minhas referências vão de autores clássicos a escritores contemporâneos, mas também vêm do cinema, quadrinho e televisão. Esse universo sempre me fascinou, principalmente porque mexe com a curiosidade e o suspense. Neste livro uso e abuso de referências como “Sin City”, "O Poderoso Chefão”, “Psicose”, “FX - Assassinato sem Morte”... Sou fã de obras que unem intensidade psicológica e força narrativa. Chuck Palahniuk ("Clube da Luta”), Anthony Burgess (“Laranja Mecânica”), Jeffery Deaver (“O Colecionador de Ossos”), Eduardo Sacheri (“O Segredo dos Seus Olhos”), Thomas Harris (“O Silêncio dos Inocentes”), Dean Koontz (“Do Fundo dos Seus Olhos”), Robin Cook (“Vírus”) são autores que me inspiraram na concepção desse livro, pela forma de criar tensão, emoção e personagens. Essas leituras, e o cinema que nasceu delas, influenciaram muito minha maneira de pensar atmosfera e ritmo narrativo.

Já tinha vontade de escrever um romance há muito tempo? Por que esperou tanto?

Já. Venho ganhando maturidade com o tempo. E me mantenho sempre em atividade, escrevendo. “A Fraternidade” traz ainda marcas do escritor que escrevia com o fígado, de quinze anos atrás. E eu gosto disso. Dessa agressividade justificada no contexto da história. Hoje respiro mais e contenho mais minha vontade de chegar ao êxtase. Demorei para publicar esse romance por dois motivos: o primeiro, e fundamental, foi que percebi que se tratava de um livro de muitas histórias dentro de uma ideia. O trabalho de cortar o excesso e chegar a um resultado final foi mais suado do que escrevê-lo. Talvez a espera tenha sido necessária para que eu pudesse contar essa história com mais experiência de vida para emprestar aos personagens. E o segundo motivo, é que minha vida pessoal, de alguma forma, acabava me fazendo crer que não era o momento ideal para lançá-lo. Mas desisti de achar um momento ideal e acatei as orientações de meu editor, André Portugal, da P55. Foi assim na música também. Precisei de empurrões para mostrar minhas músicas. Nasci arrancado por fórceps. Talvez haja uma associação implícita nisso aí.

Minha vida pessoal, de alguma forma, acabava me fazendo crer que não era o momento ideal para lançar o livro. Mas desisti de achar um momento ideal e acatei as orientações de meu editor.

Quanto de você está nas histórias?

Muito, e nada ao mesmo tempo. Há sentimentos, lembranças e até pequenos gestos meus espalhados pelos personagens. Referências de lugares que fui, de músicas que ouvi, de livros que li, quadrinhos que engoli, filmes que vi…

É como na música: você coloca um pedaço de si, mas aquilo ganha vida própria e já não pertence só a você.

Como foi a pesquisa do pano de fundo histórico? Demorou muito?

Foi intensa. Sempre gostei de história, então esse processo foi quase tão prazeroso quanto escrever. Mergulhar em documentos, notícias, relatos de época me ajudou a criar um cenário mais verdadeiro. Deu trabalho, mas foi um trabalho que me enriqueceu como pessoa. E o fato de me utilizar de cenários que visitei facilitou o processo de pesquisas. De todas as ambientações do livro, apenas Berlim e o Texas são lugares que não conheço, de fato.

Quão diferente é escrever música e escrever livro?

São linguagens diferentes, mas ligadas pelo mesmo impulso criativo. A música é instantânea, precisa caber em poucos minutos e impactar de imediato. O livro, por outro lado, é uma maratona: exige paciência, disciplina e um mergulho mais demorado. Mas ambos partem do mesmo lugar: a necessidade de expressar algo que não cabe guardado.

Outros virão por aí? Tem ideias para novos?

Sim. Quero lançar ano que vem já um livro com ambiência numa Bahia do século XIX e outro mais autobiográfico, contando a história da axé music por meio da visão de um compositor do gênero. Ambos estão quase prontos e devem ser lançados até o ano que vem. Tenho outros em construção. Mas agora que o primeiro nasceu, não me prenderei mais à timidez ou adequações de fase de vida para lançar os próximos. Então, acredito que esse não será o único.

Enquanto isso, apenas agradecer a quem me acompanha. Especialmente ao meu editor, André Portugal, que apoiou a ideia e me incentivou a publicar esse livro. A música me deu muita coisa, e agora a literatura me abre outra porta. Espero que os leitores encontrem em A Fraternidade um espaço de reflexão, emoção e companhia. Até porque, no fundo, é para isso que escrevemos: para não estarmos sozinhos.

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